segunda-feira, 19 de julho de 2010

Extra! Extra!

O Início do Fim da Imprensa

O Jornal se acabou
1ª Manchete do dia

No domingo passado, como sempre costumo fazer, fui ao centro comprar jornais. Não encontrei o jornaleiro da esquina do Banco do Brasil, que sempre foi meu preferido. Cansei de parar pra conversar com ele e saber o complemento das noticias dos jornais de sua banquinha. Afinal, ninguém entende mais de notícias do que os jornaleiros. Além do que, toda vez que eu não tinha trocado, ou dinheiro mesmo, ele me dava os jornais pra pagar na terça (o que eu sempre fiz questão de honrar, pra não dar margem a dúvidas).
Mas, como ele não estava ali mesmo, tive que descer a Getulio pra comprar daquele outro jornaleiro da esquina do Mercado Velho. E como uma antiga novidade, sua pequena banquinha estava cercada por algumas pessoas, às quais me juntei pra praticar a clássica e tradicional arte tão propalada por nossa querida Rádio Cipó: jogar papo fora, nem que seja miolo de pote.
Logo me puz a reclamar da ausência do jornaleiro de cima e a perguntar o porquê de seu sumiço, já temendo que tivesse alguma notícia não muito boa a seu respeito, uma vez que os tempos andam tão nervosos que, entre um dia e uma noite, tudo é possível. Fui surpreendido então pela informação de que ele simplesmente tinha desistido de vender jornais, bem como aquele outro jornaleiro que costumava ficar nas imediações do Hotel Rio Branco. E quando me atrevi a questionar a razão dessa desistência, a resposta dele foi simples, mas avassaladora... “O Jornal se acabou”. E diante de minha cara abestalhada ele completou o serviço dizendo... “Ninguém lê mais jornais.”Foi como se o mundo tivesse desabado.

O triste fim do JB
2ª Manchete do dia



No meio desta semana, estava inocentemente navegando no blog do Gomes, quando me deparei com uma notícia estarrecedora. A diretoria do Jornal do Brasil anunciou que muito em breve este deixará de existir na forma impressa e passará a existir apenas na “forma tecnológica”.
Imediatamente minha mente foi jogada em uma viagem na qual voltei a ver imagens que pensava esquecidas. Lembrei do vício que fui adquirindo aos poucos, como costumam ser os melhores vícios da vida, de ler jornal todo santo dia. Sempre o “Jornal do Brasil”, é claro, já que o “O Globo” era, abertamente, porta-voz da Ditadura Militar.
Com esse costume cresci e quando comecei a trabalhar de verdade só tinha tempo de ler no ônibus. O que, normalmente, significava a pratica de um difícil malabarismo que só conhece quem tem o hábito de ler jornais em ônibus cheio. Em compensação minhas longas viagens passavam rápidas e repletas de textos de alta qualidade dos articulistas daquele extraordinário jornal.
Por conta disso desenvolvi outros dois hábitos que já não me acompanham mais. O primeiro era uma técnica que aprendi olhando outros leitores-de-jornais-em-ônibus mais antigos que eu. Consistia em abrir as páginas dos jornais e dobrá-las pelo meio, no sentido vertical, para depois dobrá-las novamente no sentido horizontal. Dessa forma o jornal passava a ser dividido em quatro partes, ao invés de duas, ficando com o tamanho de um livro. O que facilitava muito a leitura e a passagem das páginas, sem ter que dar cotoveladas no passageiro ao lado, mesmo que o ônibus estivesse botando gente pelo ladrão. O segundo hábito era ler o jornal de trás pra frente. Eu sempre começava pela página de esportes e vinha desfiando o jornal até chegar na parte mais pesada e menos prazerosa do jornal, a seção de política.E, então, lembrando do quanto o “JB” foi importante na minha formação, na minha vida, na minha compreensão de mundo, fui inundado por saudades atrozes. Saudades do Caderno B, das Colunas do João Saldanha (o “João sem Medo” do jornalismo brasileiro), do Caderno Idéias, e tantas outras pequenas “cositas” que marcaram o meu tempo de vida, que senti como se tivesse recebido a notícia da morte de um parente ou de um amigo muito, muito mesmo, próximo.

Novos tempos estranhos
Do que não dá Manchete

Algumas vezes (acho que não muitas) reclamei aqui nesta coluna destes novos tempos internéticos. Desconfio da fragilidade desse suporte digital. Tenho traumas de tantos arquivos que perdi nos “paus” que essas máquinas infernais costumam dar sem nenhum aviso prévio. Além do que gosto demais de pesquisar sobre as coisas da história em livros e jornais antigos, a ponto de criar certo vício em cheiro de papel velho.
E se, de repente, o sol se enfurecer e mandar uma tempestade solar carregada de magnetismo e outras radiações desconhecidas apagando (ou “deletando” pra usar o termo da moda) todos os arquivos digitais do planeta??? De que irão se alimentar os historiadores do futuro, se tudo agora está sendo escrito na internet e muitas vezes (na maioria) só na internet? Não vai sobrar nada. Nem textos, nem imagens, nem vestígios desse nosso louco e estranho tempo.
Eu confesso. Tenho medo dos dias que virão. E não só porque a palavra impressa no papel nos dá a sensação de permanência (uma quase eternidade). Não apenas porque amo os livros e não há prazer (entre os prazeres solitários) no mundo que se iguale a folhear um livro deitado na cama, esperando o sono chegar, enquanto a imaginação viaja pelos mais recônditos e exóticos lugares e situações. Mas porque desconfio desse novo jornalismo que está surgindo.
Por tudo o que já li e vivi, acho que a experiência da redação do jornal é imprescindível para a pratica do jornalismo. Acho (porque não sou um profissional da notícia, então só posso achar) que redação de jornal é que nem banca de jornaleiro. Um lugar onde as notícias ecoam, repercutem e são discutidas até serem curtidas o suficiente para então serem impressas nas páginas dos jornais.
O que será desse novo jornalismo, agora já quase um vício solitário do sujeito diante da tela de seu computador, usando crtl c + ctrl v, para produzir matérias e mais matérias, ainda que sem nenhuma consistência. Daqui a pouco tempo, provavelmente, os blogs (ou seu irmão mais novo, o twiter) se tornarão a principal fonte das notícias em tempo real desbancando não só os jornais, mas até mesmo os sites “jornalísticos”.
Nesse dia, então, será decretado o fim da imprensa, como ação de publicar notícias impressas. Prenúncio do fim do próprio do jornalismo como ação coletiva, a partir do que será estabelecido um novo e solitário paradigma do jornalismo como ação individual, submetido a todas as idiossincrasias que carregam os indivíduos. Um novo mundo onde não haverá mais lugar nem para jornaleiros e nem para jornalistas... O que, convenhamos, será o fim dos tempos, pelo menos na forma que os conhecemos.
Sinceramente, eu não sei se quero estar aqui quando esse dia chegar...

Um comentário:

  1. Muito bom o texto. É uma realidade a mudança no jornalismo impresso. Não é o fim do jornalismo. As novas gerações vão apenas se apegar a novas formas. Não sei quais serão. As formas que nos acostumamos estão mesmo em ruínas. Mas o conteúdo é que é a questão. Não a forma. Infelizmente, os jornais de Rio Branco não são bons exemplos para se falar na mudança que ocorre no mundo todo. Eles faliram há muito tempo. A circulação estava restrita aos guetos políticos e aos leitores escatológicos da violência urbana. Não dá pra comparar a imprensa local com a morte do JB ou de outros jornais mundo afora. Quando morava em Rio Branco comprava todos os jornais e conhecia todos os jornaleiros. Procurava informações novas, versões diversas, bons temas, imagens. Ainda bem que não tenho mais essa mania. Nem na internet se encontra conteúdos locais para suprir essa demanda. O JB também estava decadente antes do tiro de misericórdia. Hoje leio a Folha de São Paulo (edição digital). Ainda tenho saudade de tatear as páginas (saudade que mato quando viajo), mas tenho certeza que a mudança ocorrerá e que a qualidade é a única que prevalece.

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