segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Breve história da música no (vale do) Acre - V*


A influencia das rádios, a chegada de novos músicos ao Acre, os populares programas de calouros, os carnavais e novas influencias musicais como o Jazz e logo a Bossa Nova, aos poucos começaram a provocar, nos final dos 40 e nos anos 50, uma nova transformação na música que estava sendo feita e ouvida por aqui.

Mesmo com as mudanças porque passava a música no Acre, a Banda da Guarda Territorial (como passou a ser denominada a partir de 1945) continuava suas atividades, atendendo aos interesses da elite, e ainda dominando o cenário musical de Rio Branco. Aliás, esta cidade, já há tantos anos capital do Território Federal do Acre, acabava por ser um ponto de forte atração para músicos de diversas cidades e seringais do interior acreano que para lá afluíam atrás de melhores oportunidades de viver de sua arte. Tanto é assim que a composição da Banda nessa época revela a presença de músicos e compositores vindos de diversos municípios acreanos.

Estavam nesse pé os acontecimentos quando Garibaldi Brasil, integrante do governo de Amilcar Dutra de Menezes, no início da década de 50, foi até Belém trazer novos músicos que dessem um maior impulso a música acreana. Logo chegavam ao Acre Raimundo Neves acompanhado por Sandoval dos Anjos, Elias Ribeiro Alves e Mário do Carmo Pires. Eles integravam um conjunto de jazz de Belém e deveriam formar a Jazz-orquestra da Rádio Difusora Acreana para dinamizar sua programação musical. Porém, não demorou muito para que o comando da Banda da Guarda Territorial, que era do Mestre Holdernes, fosse passado para o Maestro Neves (como viria a ser chamado mais tarde) que promoveu certa renovação do repertório da Banda com foxes, rumbas, mambos e músicas brasileiras como a “Aquarela do Brasil”, “Carinhoso”, etc.


Havia, assim, no Acre dos anos 50 uma nova realidade musical. Os carnavais, que sempre haviam tido presença importante na cultura acreana, ganhavam cada vez mais as ruas com a multiplicação dos blocos de sujo que nasciam em bairros como a Cadeia Velha, o Quinze e a Capoeira e assumiam a cidade durante a “Quina Momesca”. Nos assaltos carnavalescos os músicos, acompanhados por grande numero de foliões, à semelhança do que era feito nas alvoradas, invadiam as residências durante todo o mês que antecedia o carnaval. Nos clubes, especialmente no Rio Branco e na Tentâmen, também brincava-se animadamente ao som dos músicos da Banda transformados circunstancialmente em músicos carnavalescos.

As novidades que vinham através do rádio, com seus ídolos de popularidade crescente, traziam um novo elemento fundamental nas mudanças porque passava o cenário musical brasileiro e agora também o acreano: os programas de auditório e de calouros. Este tipo de programa característico da rádio brasileira chegou rapidamente ao Acre. Surgiram assim os programas de calouros da Radio Difusora e um pouco depois os da Rádio Andirá, ambos em Rio Branco. Mas as cidades do interior não ficaram para trás e criaram seus próprios programas de calouros nos colégios, clubes e rádios locais (ver biografias de Geraldo Leite e Franco Silva). 

Esses programas marcaram época por sua imensa popularidade. Os programas de calouros eram semanais e - fossem os promovidos pela Rádio Difusora na Tentâmen ou em seu próprio auditório, fossem aqueles realizados pela Andirá, ao ar livre - sempre eram presenciados por grande numero de animados espectadores que motivavam o surgimento de novos talentos e valores artísticos. Zé Lopes, Índio do Brasil e Natal de Brito eram alguns dos que apresentavam os concursos para músicos, cantores, locutores e atores, com pequenas premiações para os vencedores e a colaboração de alguns dos mais importantes músicos da Banda como jurados (Maestro Neves, Sandoval, etc.). Isso aumentou ainda mais a afluência para Rio Branco de músicos e artistas do interior que vinham se apresentar nos programas de calouros da Capital. No dizer de Crescêncio, “foram pelo menos 10 anos de extraordinária atividade da rádio, que durou pelo menos até quando o Acre foi transformado em Estado, em 1962”. 


O movimento de renovação proporcionado pelos programas de calouros, tornou a Banda da Guarda Territorial pequena para abrigar o novo contingente de músicos, tanto por seus aspectos quantitativos, quanto pelas características qualitativas desse movimento musical. É verdade que a Banda procurava adaptar-se aos novos tempos, especializando diversos de seus segmentos de acordo com gêneros musicais distintos. Ou seja, dentro da Banda da Guarda, existia um grupo menor especializado em choros, outro em valsas e assim por diante. Por outro lado, esses mesmos músicos da banda possuíam atividades musicais diversas, especialmente aquelas destinadas ao ensino da musica e à formação de conjuntos para tocar um repertório não desenvolvido pela Banda. Exemplo disso foi Zeca Torres grande que criou ainda no início da década de 50, dois conjuntos de jazz chamados simplesmente Jazz-A e Jazz-B.

Porém, por mais que o repertório e a técnica instrumental da Banda da Guarda Territorial fossem continuamente aprimorados, sua função social ainda permanecia a mesma: a ingerência do poder instituído sobre a cultura de massas. Isso limitava fortemente a diversificação das atividades da Banda.

Em contraposição a isso o Brasil exportava (e ainda exporta) músicas, melodias e ritmos de qualidade igual ou superior a de qualquer outro país do mundo consumista com sua mídia globalizada. Ou seja, em termos musicais, pelo menos nesses termos, somos o “primeiro mundo”. Com a vantagem de exercermos esse papel através da linguagem universal dos povos, a música. Afinal de contas, não há quem não compreenda a “cadência bonita do samba”.

E o Acre? Este pedaço preterido do mundo. Espaço perdido e atraente para muitos dos novos músicos do interior. Para tanto, colaborava ainda mais o contexto musical brasileiro e mundial em franca ebulição na passagem dos anos 50 para os 60. A nova geração de músicos acreanos queria tocar o samba, a musica popular e as ultimas novidades: a bossa-nova e o rock’n roll, sem ter que restringir-se somente às valsas, marchas e dobrados.

*Texto publicado originalmente na Revista Registro Musical, FGB, 1996 (Ilustrações de Danilo de S'Acre)

2 comentários:

  1. Marcos,
    esta tua sequência de artigos sobre a história da música no Acre é formidável.
    Muito obrigado!

    Abraços!

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    1. Valeu Isaac, só temo q as pessoas no geral não gostem destes textos muito longos... Mesmo assim vamos sobrevivendo... com apenas alguns arranhões... rsrsrsrs... abs

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