sábado, 22 de outubro de 2011

Pequenas histórias de quintal (II)

(ou Meu quintal, minha colonha, meu mundo)

Hoje comi, pela primeira vez, açaí do meu quintal. E tava gostoso, ó! Sinto falta mesmo é do nosso coqueiro. Fiquei triste quando alargaram a rua e tivemos que tira-lo. Preferia ele ao muro e a calçada e a rua alargada...

Foi graças ao coqueiro que a gente plantou esses Açaís. Não daqueles Açaís solteiros das matas daqui, mas os de touceira que vieram lá do Pará. Santa mistura amazônica. E ficaram bonitos nossos Açaís. Duas touceiras parrudas com muitas hastes e muitos, muitos, cachos. Terna palmeira que chora minúsculas lágrimas tão roxas quanto seus frutos e atrai hordas de periquitos galhofeiros todos os dias.
Quem ainda não quis dar de jeito nenhum, apesar de já ter também uns seis anos, foi o pé de Jabuticaba. Este veio de uma casa no Bosque onde fui por acaso e estava lá bonito, novinho, esperando na forquilha d’um pé de Jabuticaba pra lá de carregado. E a pequenina muda não só vingou como cresceu galhudo e saudável. Mas Jabuticaba que é bom mesmo, até agora nada. Alguém me disse que Jabuticaba demora mesmo muito pra dar. Mas não vejo a hora, gosto por demais de Jabuticaba e dá menos trabalho ainda que Cajá. É só espocar e pronto. Nem suja a mão.
Da mesma época, mas com um caráter oposto ao da Jabuticaba, é o pé de Carambola lá do fundo. Este é dadeiro... Não deixa de estar carregado em tempo nenhum. Ninguém dá conta. Sobra demais a tal Carambola. Até os galhos dela são engraçados: finos e encurvados pelos cachos cheios. Até parecem pedir: anda, pega uma carambolinha aqui! Diria mesmo que são oferecidas essas tais Carambolas...
Aliás, desse jeito também é a Acerola. Tão novinha quanto o pé de Araçá, mas produz muito o tempo todo. Pena que dá tanta coceira pegar essas coisinhas vermelhas que viram um suco tão bom. Basta triscar no galho e pronto. Coça, coça que só a peste. Mas tenho muita pena mesmo quando não dá pra escapar do decreto da Duy: Pega lá uma acerolinha pros meninos... Então tenho pena demais de mim...
Pra compensar, porque tudo na vida tem sua compensação, o pezinho de Aracá que falei ainda pouco, é pequeninho, baixinho, facinho de cuidar, mas dá cada Araçá parrudo e pesado que é quase uma jarra inteira de suco. E é forte o suco do Araçá. Presente do velho Francisquinho Seringueiro que mora lá embaixo do morro, depois desse igarapé que também chama Francisco.


Acho engraçado como as plantas são diferentes entre si. Tem daquelas que ficam bem sozinhas. Mas têm outras que só vivem de duas, no mínimo. E não adianta o que se faça, elas vão sempre dar um jeito pra ficar acompanhadas. Assim é a Cuité. Tão teimosa que virou no vento, parecia que ia morrer, ficou pensa, de raízes pra fora, mas tornou a brolhar. Como se ela não pudesse deixar a Cuité mais novinha do meio do quintal ficar sozinha. Eu gostei. Porque arvore bonita é a Cuité quando perde as folhas que depois renascem diretamente de seus galhos-troncos com um dos verdes mais bonitos que já vi. Além dos grandes frutos que servem pra fazer cuia de tacacá, vaso pra plantas, luminárias pra casa, tigelas pros cachorros... Dizem até que os índios usavam também pra chocalhos mágicos, mas isso eu não sei fazer.
Igual também que as Castanhas Elétricas que o velho bruxo Hélio Khoury nos deu. Eram duas mudas entrelaçadas num saco só. Plantei assim mesmo pra depois deixar apenas a maior. Mas as duas vingaram e cresceram entrelaçadas. Hoje parecem uma só e não dá mais pra tirar uma sem tirar também a outra. E, mesmo não sendo de comer, além de florar direto suaves e belas flores amarelas, a Castanha Elétrica é muito útil: serve pra não se perder na mata, pra afastar mordida de cobra, pra curar dor de cabeça, pra tirar mal pensamento, pra dar sorte e energia pra quem carrega, como ensinava sempre Seu Hélio.
E têm ainda outras que nascem sozinhas, mesmo sem terem sido chamadas, como esse pé de Cacau que nasceu bem na porta de casa. A coisa mais atrapalhada do mundo. Dá dó de tirar o teimoso. Até porque dar Cacau que é bom, até agora nada. Bem que parece ter tentado. Floriu um bocado, aquelas pequeníssimas flores do cacau e, ainda, botou uns frutinhos que foram crescendo, crescendo, mas caíram. Fora o trabalho que dá podar pra não atrapalhar a escada... O certo é que ainda não sei ao certo o que fazer com esse Cacau inxerido.
Diferente do Pinhão Roxo que, desde que cheguei por aqui, teima em ficar na porta de casa. E ainda muda de lugar. Uma hora ele está do lado de cá, cresce, dá flores e sementes e murcha e some. Tempos depois um de seus filhotes reaparece pra lá do portão. Mas nunca deixa de ficar por ali, perto da porta rondando. Ainda bem! O povo diz que é bom ter Pinhão Roxo na porta de casa, porque afasta o mau-olhado, dizem. Eu até gosto de suas flores breves e brutas, como gosto do vermelho meio verde que suas folhas tem de vez em quando. Mas gosto mesmo é de pensar que eu protejo ela no quintal e ela protege nós todos aqui em casa das maldades do mundo lá fora.
É. Faltava ainda falar das outras flores, dos passarinhos e dos bichos que chegam de repente e ficam com gente... Mas não vai dar pra falar disso tudo ainda, acabou-se o espaço pra essa história. Tem problema não, fica pra outra hora. É que, como vocês podem ver o meu quintal é um mundo vasto. Quem vê os limites de seus muros, não adivinha quanta vida ele tem e quantas histórias vivemos todos nós juntos: eu, a Duy, os meninos, as arvores e suas frutas, as plantas e seus mistérios, os bichos e seus jeitos, o pedaço de céu que nos abriga, de chão que nos sustenta, de floresta em que crescemos. Afinal, o universo inteiro cabe em nosso quintal.

Um comentário:

  1. ola boa tarde. me chamo silmara e estava lendo seu blog e gostaria de saber onde voce comprou esse pinhao roxo. ou se seria possivel me passar um muda ou sementes, pois a muito tempo procuro e nunca encontro. grata aguardo.
    whats 018 997861222

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