domingo, 2 de outubro de 2011

Duas vezes cem miolos

Foi no 12º ano de existência do jornal Página 20, em um domingo, 12 de novembro de 2006, que estreei a coluna Miolo de Pote. E numa dessas coincidências do destino, o artigo numero 200 desta coluna não coincidiu com o aniversário de cinco anos da coluna. Fazer o que? Nem tudo é perfeito nessa vida, mas decidi registrar o fato mesmo assim. Já que pra mim, de todo jeito, esta é uma marca inédita.

Quando comecei essa brincadeira de Miolo de Pote não podia imaginar que ela iria tão longe... Mas como, logo de início, peguei a mania de numerar os arquivos acabei prestando atenção ao acumulo de artigos até chegar, hoje, ao numero 200.
O que significa isso? Absolutamente nada, eu sei...
Porém, como os homens, desde o início dos tempos, gostam de calendários e gostam ainda mais de números redondos, não se pode estranhar, humano que sou, esse meu desejo de também considerar o artigo de numero 200 algo especial, como se fosse o próprio dia do fim do mundo...
Na verdade, este artigo é apenas uma oportunidade autoconcedida de pensar o que tem sido essa brincadeira séria chamada “coluna Miolo de Pote”.



Já contei aqui que o nome da coluna foi generosamente sugerido pelo Toinho Alves. Por mim o nome seria algo como “Botija de Histórias”, numa referencia à lendária botija de ouro (às vezes revelada pela misteriosa mãe do ouro) que encantava os seringueiros nos seringais de tempos idos. Mas, como bom tituleiro que o Toinho sempre foi, perguntei sua opinião... E ele me saiu com essa: porque não Miolo de Pote, já que não tem nada mais tradicional no Acre do que conversar miolo de pote numa sombra ou varanda qualquer?
De imediato gostei da idéia de tratar de coisas do interior das coisas e, ao mesmo tempo, ser tão despretensioso e descontraído quanto um bom papo furado. Era bem o que eu queria... e assim ficou sendo. Afinal, admitir a própria desimportância pode ser uma poderosa vacina contra os erros da prepotência, tão recorrente neste dias loucos em que vivemos...



Também já revelei aqui, em diferentes ocasiões, meus motivos pra ter essa coluna. Anteriormente eu havia escrito em outros jornais ou revistas, assinando colunas e/ou artigos, em caráter temporário ou permanente, e, em todas as vezes, foi uma experiência muito prazerosa. Até porque quem gosta de ler, quase sempre também gosta de escrever.
Mas, quem escreve sabe que, ao longo da vida, esse prazer, que no início parece tão inocente, vai se tornando uma necessidade, uma compulsão tão irresistível quanto respirar. Assim, confesso, escrevo porque preciso.
Além disso, conhecer a história do Acre se tornou outro vício incurável. Quanto mais leio, ouço, aprendo, maior minha vontade de contar os acontecidos desse mundo imaginário chamado Acre. Se não, aprender pra que?
E tem também as encrencas em que sempre me meto, porque simplesmente não consigo ficar quieto ao ver a história acreana sendo tratada com desonestidade. Em uma de suas geniais musicas Renato Russo disse que o mal do século é a solidão. Pois eu discordo, acho que o mal deste século e também dos passados é a vaidade. O que os homens são capazes de fazer em prol de seus próprios egos é inacreditável. Seja uma pesquisa mal feita aqui, uma coleção de documentos roubados ali, seja um sutil contrabando de material arqueológico acolá. Assim, acabei me tornando um seguidor da história-combate proposta por Marc Bloch no tempo dos Annales. Ainda que isso, às vezes, me custe caro. Fazer o que?! Como diz o outro são os “ossos do ofício”.
Finalmente, mas não menos importante, tem ainda meu apego ao que sai impresso em papel nestes tempos estranhos de internet. Desconfio que 99% do que sai na rede não vai sobreviver mais do que dez anos. É tudo muito virtual pra ser real por muito tempo. Vai que o sol decide embrabecer, provoque uma tempestade magnética e apague todos os discos rígidos do planeta... lascou-se...
Sou historiador e minha matéria-prima é o que sobrevive ao tempo. Além do que, não há nesta vida prazer comparável a encontrar aquele velho livro imprescindível para a atual pesquisa, ou a matéria de jornal que explica o que você nem desconfiava, ou ainda o documento amarelado perdido entre trocentos outros documentos onde se prova o que poderia parecer completamente improvável. Ou seja, acredito ser fundamental publicar num jornal impresso de verdade... talvez, assim, esses artigos sobrevivam para além de mim...



Só pra variar e permanecer fiel ao hábito que toda semana me atormenta na hora de fazer o artigo, acabei escrevendo demais e ainda não falei nem metade do que queria e nem lembrei de um terço das pessoas que queria agradecer... o jeito é, de novo, deixar pra próxima...

Um comentário:

  1. "o mal deste século e também dos passados é a vaidade" foi ótimo!

    seu jeito coloquial de transcorrer pensamentos inteligentes é cativante meu amigo. Sou seu fã e sabe disso. Mas como amigo, sinto-me livre a qualquer crítica que ache pertinente, o que não é o caso, fique tranquilo.

    escrevo mais para, como tb escritor (apesar de neófito), te parabenizar pela marca 200 e para sugerir, como fã, a possibilidade de impressão agrupada de todos os artigos em um livro "O Miolo do pote do MV".
    ;)

    Na verdade, o importante não é o título, mas a impressão propriamente dita, nem que seja apenas para poucos (fãs, historiadores, colecionadores, etc.).

    Abraço maninho!

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