sábado, 22 de maio de 2010
Tirando o atraso...
Durante toda a semana passada minha internet indomável resolveu ficar especialmente indomável e não consegui postar os dois artigos da Célia, que acumularam então com o artigo da coluna desta semana. Assim, lá vão eles na ordem em que foram pro jornal.
Botija de Histórias
No próximo dia 03 de julho a cidade de Brasiléia completará cem anos de sua fundação. O que faz com que esta cidade seja uma das mais antigas do Acre. Por isso, além de aproveitar o já tradicional e animado Carnavale, esta é também uma boa ocasião pra lembrarmos algumas das peculiaridades da vida nos limites do Brasil.
Assim, nas próximas semanas esta coluna vai trazer alguns textos mais antigos e outros inéditos sobre as histórias de Brasiléia, fim do Brasil, início do Acre.
Assim, nas próximas semanas esta coluna vai trazer alguns textos mais antigos e outros inéditos sobre as histórias de Brasiléia, fim do Brasil, início do Acre.
Do outro lado do igarapé*
Quando chegamos em Cobija - cidade boliviana situada na fronteira, do outro lado do Igarapé Bahia, em frente à cidade de Brasiléia - era sábado de carnaval e o que vimos foi diferente de tudo que podíamos imaginar. Ao invés da multidão pulando e dançando ao som de marchinhas carnavalescas com que estamos acostumados, as crianças corriam pra todos os lados tentando acertar bexigas cheias d’água umas nas outras. Não entendíamos nada, mas a brincadeira era divertida. Especialmente porque ninguém parecia ficar chateado ao ser atingido e infalivelmente encharcado.
Mais na frente encontramos diversos grupos fantasiados ricamente. Eram grupos de dez a vinte pessoas caracterizadas de acordo com as várias regiões dos Andes ou com grupos étnicos específicos. Foi engraçado ver aquele grupo de bolivianos pintados de preto dos pés à cabeça representando, parece, os africanos que foram trazidos para a América há séculos atrás. Outro grupo nos chamou a atenção pela beleza e luxo das fantasias de veludo negro bordadas com fios dourados e lantejoulas simetricamente distribuídas. Como nosso tempo era pouco, não pudemos assistir, mas ficamos sabendo por informações, que todos aqueles grupos desfilariam na avenida principal da cidade ao som de bandas formadas por instrumentos de sopro e de corda. Quanta diferença de nossas batucadas e blocos de “piranhas” tão familiares para nós quanto devem parecer estranhos para olhos estrangeiros.
Seguimos, então, para longe da fronteira, em direção ao interior da Bolívia, rumo à cidade de Porvenir, ponto terminal da estrada asfaltada - a margem do rio Tahuamano - e inicio de um longo caminho de lama, poeira e pedras montanha acima até alcançar La Paz, a longínqua capital boliviana, distante dali 1.145 Km.
Mais uma pequena cidade, em quase nada diferente das pequenas cidades de nosso próprio interior, Porvenir existe em torno de uma praça dominada por um monumento que ao invés de possuir a tradicional estatua do herói local ou nacional, é diferente, possui três estatuas. Paramos a frente do estranho monumento tentando entender seu significado. E o que logo nos chamou a atenção em sua placa comemorativa foi a referencia ao combate, de triste memória para os brasileiros, do Igarapé Bahia. Grande vitória boliviana, conquistada às margens do igarapé que hoje divide o que é Brasil e o que é Bolívia.
Isso nos fez procurar alguém que pudesse contar o significado daquelas três estátuas e encontramos dona Ana Aguilera, uma simpática “maestra jubilada” que com menos de meia hora de conversa havia encantado a todos com a objetividade e sinceridade que expressava em todas as suas opiniões. E foi assim que além de nos explicar o significado do monumento, Dona Ana nos revelou algumas verdades que nunca havíamos sido capazes de compreender.
Com imensa surpresa aprendemos com a simpática professora aposentada que a Bolívia não foi derrotada na Guerra do Acre. A Bolívia perdeu o Acre sim. Mas não pelas armas. Perdeu pela lei, pelos tratados negociados com honra e honestidade e recebeu suas compensações por isso. Soubemos também que aquela famosa coluna Porvenir vitoriosa sobre os brasileiros à margem do igarapé Bahia, não era do exército regular boliviano, mas formada por seringueiros e campesinos da região, em nada diferente do exército de seringueiros brasileiros que tanto nos orgulhamos de lembrar.
Foi assim, numa tarde de sábado, em plena Bolívia, que tivemos uma aula de história e também uma lição inesperada sobre a secular necessidade do encontro entre dois povos vizinhos que não se conhecem.
Quanto ao combate do igarapé Bahia e à estatua de Porvenir só no próximo artigo.
* Artigo publicado no Jornal Estado do Acre, em 25 de fevereiro de 2002
Mais na frente encontramos diversos grupos fantasiados ricamente. Eram grupos de dez a vinte pessoas caracterizadas de acordo com as várias regiões dos Andes ou com grupos étnicos específicos. Foi engraçado ver aquele grupo de bolivianos pintados de preto dos pés à cabeça representando, parece, os africanos que foram trazidos para a América há séculos atrás. Outro grupo nos chamou a atenção pela beleza e luxo das fantasias de veludo negro bordadas com fios dourados e lantejoulas simetricamente distribuídas. Como nosso tempo era pouco, não pudemos assistir, mas ficamos sabendo por informações, que todos aqueles grupos desfilariam na avenida principal da cidade ao som de bandas formadas por instrumentos de sopro e de corda. Quanta diferença de nossas batucadas e blocos de “piranhas” tão familiares para nós quanto devem parecer estranhos para olhos estrangeiros.
Seguimos, então, para longe da fronteira, em direção ao interior da Bolívia, rumo à cidade de Porvenir, ponto terminal da estrada asfaltada - a margem do rio Tahuamano - e inicio de um longo caminho de lama, poeira e pedras montanha acima até alcançar La Paz, a longínqua capital boliviana, distante dali 1.145 Km.
Mais uma pequena cidade, em quase nada diferente das pequenas cidades de nosso próprio interior, Porvenir existe em torno de uma praça dominada por um monumento que ao invés de possuir a tradicional estatua do herói local ou nacional, é diferente, possui três estatuas. Paramos a frente do estranho monumento tentando entender seu significado. E o que logo nos chamou a atenção em sua placa comemorativa foi a referencia ao combate, de triste memória para os brasileiros, do Igarapé Bahia. Grande vitória boliviana, conquistada às margens do igarapé que hoje divide o que é Brasil e o que é Bolívia.
Isso nos fez procurar alguém que pudesse contar o significado daquelas três estátuas e encontramos dona Ana Aguilera, uma simpática “maestra jubilada” que com menos de meia hora de conversa havia encantado a todos com a objetividade e sinceridade que expressava em todas as suas opiniões. E foi assim que além de nos explicar o significado do monumento, Dona Ana nos revelou algumas verdades que nunca havíamos sido capazes de compreender.
Com imensa surpresa aprendemos com a simpática professora aposentada que a Bolívia não foi derrotada na Guerra do Acre. A Bolívia perdeu o Acre sim. Mas não pelas armas. Perdeu pela lei, pelos tratados negociados com honra e honestidade e recebeu suas compensações por isso. Soubemos também que aquela famosa coluna Porvenir vitoriosa sobre os brasileiros à margem do igarapé Bahia, não era do exército regular boliviano, mas formada por seringueiros e campesinos da região, em nada diferente do exército de seringueiros brasileiros que tanto nos orgulhamos de lembrar.
Foi assim, numa tarde de sábado, em plena Bolívia, que tivemos uma aula de história e também uma lição inesperada sobre a secular necessidade do encontro entre dois povos vizinhos que não se conhecem.
Quanto ao combate do igarapé Bahia e à estatua de Porvenir só no próximo artigo.
* Artigo publicado no Jornal Estado do Acre, em 25 de fevereiro de 2002
Dez anos ... (2ª Parte)
(1ª parte – domingo)
Formalmente seu nome todo era Mauricélia Barrozo Alves de Sousa (Barrozo com z e Sousa com s, favor não se enganar). Mas ninguém a chamava assim. Nem em casa e nem na rua. Para todos ela era apenas Célia e para alguns, muitos, ainda, simplesmente Celinha (...).
(2ª Parte – terça-feira)
A mesma turma que - junto com o Prof. Rui Duarte (em memoráveis viagens ao Sítio Los Angeles – Xapuri) e, um pouco mais tarde, com o Prof. Oldemar Blasi - fez as primeiras e únicas (infelizmente) pesquisas arqueológicas realizadas pela UFAC até hoje. Uma experiência que determinou que Célia viesse a se tornar a primeira arqueóloga acreana.
Mas não só. Além de ser uma das técnicas da Fundação Cultural que ajudou a organizar e manter o Museu da Borracha, desde os anos 80; foi também Coordenadora do Patrimônio Histórico e Cultural da Fundação Garibaldi Brasil na gestão de Antonio Alves, quando deu início a todo esse trabalho de recuperação, revitalização e valorização de nosso Patrimônio Cultural que depois se consolidou nas duas gestões do Governador Jorge Viana e que pode ser facilmente reconhecido por toda a cidade de Rio Branco e do Estado do Acre.
A par de suas atividades como gestora pública, seu talento e disciplina para a pesquisa tornaram-na a maior especialista que já tivemos em fontes hemerográficas do Acre. Sua paixão pelos jornais antigos foi canalizada para muitas outras paixões, dentre as quais, em especial, a história do cinema e do teatro acreanos. O que resultou em sua monografia de conclusão de curso, infelizmente ainda desconhecida da maioria dos pesquisadores (o que teremos que corrigir em breve), onde desfiou histórias desde os primeiros tempos do cinematógrapho que funcionava no Campo dos Pipiras, nas primeiras décadas da existência de Rio Branco, até a consolidação do gosto da sociedade local pelo cinema com a criação do Cine-teatro Recreio, Cine Acre e Cine Rio Branco.
Mais tarde tive o prazer e a honra de compartilhar com ela a publicação de diversos artigos e livros sobre diferentes temas da história acreana, tais como o álbum fotográfico sobre a formação do Bairro Seis de Agosto e o livro “O Capitão e as seringueiras”, sobre a origem do Parque Capitão Ciriaco. Fora aquilo que fizemos e ainda não foi publicado, como o livro Vertentes da Memória sobre o Cacimbão da Capoeira através da história oral, e uma infinidade de pesquisas temáticas que continuam norteando o trabalho de Patrimônio Histórico aqui no Acre.
Mas, independente de qualquer outra paixão, o que mais falava ao coração da Célia era mesmo a arqueologia acreana. E não foi por outro motivo que ela se despencou para o Rio de Janeiro, onde em menos de três anos se tornou uma das principais pesquisadoras do Instituto de Arqueologia Brasileira (IAB); desenvolvendo inúmeras pesquisas no Rio, em Minas Gerais e na Amazônia, através do que se tornou especialista em cerâmica pré-histórica.
Com isso conseguiu financiamento do Smithsonian Intitution e da National Geographic Society para realizar aqui no Acre diversas missões de pesquisa arqueológica nos sítios arqueológicos com estruturas de terra geométricas (“geoglífos”) que haviam sido descobertos por Ondemar Dias, no final dos anos setenta.
Sua fecunda atividade como arqueóloga, além de ter motivado duas teses de doutorado na Universidade Federal Fluminense (UFF), era tema da dissertação de mestrado que estava elaborando na Universidade Federal do Rio de Janeiro (ICS-UFRJ), quando o destino ocasionou uma reviravolta completa em nossas vidas.
Em 1998, em meio a uma série de acontecimentos muito dolorosos em sua família, Célia teve que começar uma enorme batalha por sua própria vida. Uma luta que durou dois anos, durante os quais ela nunca esmoreceu ou se entregou, numa impressionante demonstração de força e fé.
Até seus últimos dias, já imersa num doloroso tratamento rádio e quimioterápico, continuava frequentando a Biblioteca Nacional, atrás reunir matérias sobre o Acre nos jornais do início do século XX. Era uma forma de, com infinita coragem e determinação, não esquecer quem era e nem o que fazia nesta terra.
Até que em um domingo, dia das mães, 14 de maio de 2000, Mauricélia - mãe de meu filho João Luiz que hoje, dez anos depois, já é um belo e digno homem - nos deixou... Mas tenho certeza que, como eu, todos aqueles que tiveram o privilégio de conviver com ela são incapazes de esquecer o tanto que ela fez pelo Acre e por nós...
E quando penso nisso não consigo evitar a sensação de que a vida é mesmo como o rio Acre, tem tantas curvas, voltas e reviravoltas que às vezes é quase impossível saber o preciso rumo de nossos destinos. Só nos resta, então, realizar nesta vida o que há de melhor em nós, pois que assim era a Celinha. E ter fé de que um dia iremos nos reencontrar, afinal...
“Vou seguindo pela vida
Varejando de ubá.
Todos os rios dessa terra
unidos chegarão ao mar”
(Pia Vila, Felipe Jardim, Txai Terri)
Dez anos ... (1ª Parte)
“Retrocedendo aos primórdios e acompanhando o curso das coisas até o fim, aprendemos os ensinamentos do nascimento e da morte. A união da semente e da força gera todas as coisas; a evasão da alma causa a mutação. Através disso podemos reconhecer as condições dos espíritos que partem e dos que retornam.”
(I Ching, o Livro das Mutações, Pág. 226)
(I Ching, o Livro das Mutações, Pág. 226)
“Ando devagar
Porque já tive pressa.
E levo esse sorriso
Porque já chorei demais.
Cada um de nós
Compõe a sua história.
Cada ser em si carrega o dom
de ser capaz e ser feliz...”
(Almir Sater)
Formalmente seu nome todo era Mauricélia Barrozo Alves de Sousa (Barrozo com z e Sousa com s, favor não se enganar). Mas ninguém a chamava assim. Nem em casa e nem na rua. Para todos ela era apenas Célia e para alguns, muitos, ainda, simplesmente Célinha.
Quem não a conhecia achava, à primeira vista, que era integrante de uma das muitas tribos acreanas. Uma bela índia de olhos claros, da cor do mel. E, na verdade, ela era mesmo tão doce quanto o mel de seus olhos. Mas não era indígena. Pelo menos não assim, de forma direta.
Seu pai, Seu João, era mais um dos muitos nordestinos vindos na loucura da Batalha da Borracha. Sua mãe, Dona Joana, era do interior do Acre, filha de nordestinos e, talvez, também de indígenas dessa grande floresta acreana.
Aliás, para a grande maioria, a Célinha era acreana do pé rachado e isso de fato ela era. Mas, por força do destino, havia nascido em Guajará Mirim, nesta imensa fronteira entre o Brasil e a Bolívia, filha dessa infinita floresta sem fronteiras. E amava esta terra, com uma força e uma determinação impressionantes. Por isso mesmo, ninguém tinha dúvida que ela fosse daqui, filha daqui, do Aquiry.
Pra dizer a verdade ela era uma pessoa muito fácil de lidar, na dela, apesar do permanente brilho de seus olhos revelar aos mais atentos que ela era calada por jeito, mas de boba não tinha nada. Entretanto, apesar dessa característica e contagiante tranqüilidade, queria ver a mulher virar onça era só falar mal do Acre.
Quantas vezes eu vi ela, lá no distante e intolerante sul maravilha, defendendo com unhas e dentes o Acre. E olha que não era uma época muito fácil de fazer isso. Início dos anos 90, um monte de coisas dando errado por aqui. Mas isso não importava. Nunca fez a menor diferença. Em sua presença ninguém falava mal dessa terra que ela tanto amava.
E não estou, em absoluto, exagerando. Nem sequer estou falando isso pra valorizá-la, porque ela não precisava disso, e quem a conheceu sabe. Mas por uma questão de justiça. Não havia semana em que ela não ligasse algumas vezes pra família, pra saber como estavam as coisas por aqui, pra contar como tinha saudade e como não via a hora de voltar logo...
Era tanto Banzo, tanto sofrimento pela distancia inclemente, que acabou me convencendo a vir pra cá. Primeiro de visita; pra conhecer essa floresta já distante, estranha e inesperadamente restrita ao horizonte. Mas também pra conhecer a Rainha da Floresta e ver/ouvir/sentir (não há verbo na língua portuguesa que possa expressar essas coisas) suas lições, que ainda busco compreender, mesmo vinte anos depois, diga-se de passagem.
E com isso, mais tarde, me convenceu a vir de vez, largando emprego, mestrado, família, amigos e todo o resto; pra mudar definitivamente minha vida; pra aceitar o fato que ninguém vem ao Acre impunemente. Pra aprender de uma vez por todas que aqui não temos uma causa, no Acre, é a causa que nos tem. Como sabiamente ensina, outra das extraordinárias mulheres acreanas, Marina.
Foi só então que eu soube inteiramente quem era a Mauricélia, Célia, Celinha. Que pesquisadora extraordinária! A mais disciplinada, detalhista, organizada e perfeccionista pesquisadora que já conheci nesta vida. Daquelas que não aprendeu a ser assim. Sempre foi. ÔÔÔÔ que inveja monstra... ÔÔÔ que falta doida...
Até onde eu sei, contar o tanto que essa mulher produziu ao longo de sua tão breve atividade profissional, não caberia aqui... Essa é uma história que ainda vou ter que escrever um dia, apesar dela ser tão viva na cabeça/coração de tantas pessoas, apesar de estar registrada em tantas publicações, apesar de fazer parte da história de tantas instituições acreanas.
Mas como esse artigo é pra lembrar. Não custa lembrar pelo menos uma parte do tanto que nos deixou. Ela foi de uma turma de história antológica na UFAC. Uma turma que junto com a Profª. França (outra saudade doída) levantou todos os jornais antigos do Acre, do IGHA (Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas) e da Biblioteca Nacional, produzindo uma preciosa coleção de jornais microfilmados que ainda hoje está no CDIH-UFAC nos abastecendo de histórias e mais histórias. Jornais que, de outra forma, certamente já não estariam mais disponíveis para nós e para os pesquisadores que virão.
Porque já tive pressa.
E levo esse sorriso
Porque já chorei demais.
Cada um de nós
Compõe a sua história.
Cada ser em si carrega o dom
de ser capaz e ser feliz...”
(Almir Sater)
Formalmente seu nome todo era Mauricélia Barrozo Alves de Sousa (Barrozo com z e Sousa com s, favor não se enganar). Mas ninguém a chamava assim. Nem em casa e nem na rua. Para todos ela era apenas Célia e para alguns, muitos, ainda, simplesmente Célinha.
Quem não a conhecia achava, à primeira vista, que era integrante de uma das muitas tribos acreanas. Uma bela índia de olhos claros, da cor do mel. E, na verdade, ela era mesmo tão doce quanto o mel de seus olhos. Mas não era indígena. Pelo menos não assim, de forma direta.
Seu pai, Seu João, era mais um dos muitos nordestinos vindos na loucura da Batalha da Borracha. Sua mãe, Dona Joana, era do interior do Acre, filha de nordestinos e, talvez, também de indígenas dessa grande floresta acreana.
Aliás, para a grande maioria, a Célinha era acreana do pé rachado e isso de fato ela era. Mas, por força do destino, havia nascido em Guajará Mirim, nesta imensa fronteira entre o Brasil e a Bolívia, filha dessa infinita floresta sem fronteiras. E amava esta terra, com uma força e uma determinação impressionantes. Por isso mesmo, ninguém tinha dúvida que ela fosse daqui, filha daqui, do Aquiry.
Pra dizer a verdade ela era uma pessoa muito fácil de lidar, na dela, apesar do permanente brilho de seus olhos revelar aos mais atentos que ela era calada por jeito, mas de boba não tinha nada. Entretanto, apesar dessa característica e contagiante tranqüilidade, queria ver a mulher virar onça era só falar mal do Acre.
Quantas vezes eu vi ela, lá no distante e intolerante sul maravilha, defendendo com unhas e dentes o Acre. E olha que não era uma época muito fácil de fazer isso. Início dos anos 90, um monte de coisas dando errado por aqui. Mas isso não importava. Nunca fez a menor diferença. Em sua presença ninguém falava mal dessa terra que ela tanto amava.
E não estou, em absoluto, exagerando. Nem sequer estou falando isso pra valorizá-la, porque ela não precisava disso, e quem a conheceu sabe. Mas por uma questão de justiça. Não havia semana em que ela não ligasse algumas vezes pra família, pra saber como estavam as coisas por aqui, pra contar como tinha saudade e como não via a hora de voltar logo...
Era tanto Banzo, tanto sofrimento pela distancia inclemente, que acabou me convencendo a vir pra cá. Primeiro de visita; pra conhecer essa floresta já distante, estranha e inesperadamente restrita ao horizonte. Mas também pra conhecer a Rainha da Floresta e ver/ouvir/sentir (não há verbo na língua portuguesa que possa expressar essas coisas) suas lições, que ainda busco compreender, mesmo vinte anos depois, diga-se de passagem.
E com isso, mais tarde, me convenceu a vir de vez, largando emprego, mestrado, família, amigos e todo o resto; pra mudar definitivamente minha vida; pra aceitar o fato que ninguém vem ao Acre impunemente. Pra aprender de uma vez por todas que aqui não temos uma causa, no Acre, é a causa que nos tem. Como sabiamente ensina, outra das extraordinárias mulheres acreanas, Marina.
Foi só então que eu soube inteiramente quem era a Mauricélia, Célia, Celinha. Que pesquisadora extraordinária! A mais disciplinada, detalhista, organizada e perfeccionista pesquisadora que já conheci nesta vida. Daquelas que não aprendeu a ser assim. Sempre foi. ÔÔÔÔ que inveja monstra... ÔÔÔ que falta doida...
Até onde eu sei, contar o tanto que essa mulher produziu ao longo de sua tão breve atividade profissional, não caberia aqui... Essa é uma história que ainda vou ter que escrever um dia, apesar dela ser tão viva na cabeça/coração de tantas pessoas, apesar de estar registrada em tantas publicações, apesar de fazer parte da história de tantas instituições acreanas.
Mas como esse artigo é pra lembrar. Não custa lembrar pelo menos uma parte do tanto que nos deixou. Ela foi de uma turma de história antológica na UFAC. Uma turma que junto com a Profª. França (outra saudade doída) levantou todos os jornais antigos do Acre, do IGHA (Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas) e da Biblioteca Nacional, produzindo uma preciosa coleção de jornais microfilmados que ainda hoje está no CDIH-UFAC nos abastecendo de histórias e mais histórias. Jornais que, de outra forma, certamente já não estariam mais disponíveis para nós e para os pesquisadores que virão.
segunda-feira, 10 de maio de 2010
Quase tão bom quanto sexo...
Este ano e, em especial, estas últimas semanas tem me deixado muito animado pela profusão de eventos, publicações e palestras de alta qualidade que vem acontecendo. Pra facilitar um breve passeio por esse conjunto de “animações” serei, grosso modo, cronológico.
Relicário
Logo no reinício desta coluna prometi tratar mais detalhadamente do excepcional livro de Edson Lodi, um dos principais dirigentes da União do Vegetal, chamado “Relicário – Imagens do Sertão”. Um verdadeiro primor, a começar pela edição do livro, realizada com material de primeira qualidade e uma programação visual agradável, limpa e, o mais importante, que valoriza ainda mais o extraordinário conteúdo deste enorme trabalho de pesquisa.
Em “Relicário”, Edson Lodi descreve boa parte da trajetória desse importante personagem da história da Amazônia Ocidental e do Brasil: a vida e a obra do Mestre José Gabriel da Costa, criador da mais recente das três doutrinas que fundaram uma nova religiosidade, originada da floresta e dos povos que nela vivem, em nosso planeta já tão sofrido de tantas guerras e sofrimentos.
Mas, como já falei no lançamento acreano (realizado como parte da programação do Seminário das Culturas Ayahuasqueiras – que pra mim foi um dos mais importantes eventos ocorridos no Acre nos últimos tempos – mas que, por isso mesmo, merece um artigo específico) deste livro tão belo quanto importante, seu maior mérito talvez nem esteja em sua primorosa e bem cuidada edição, e nem mesmo em seu tema tão relevante. Talvez, sua mais importante contribuição esteja no original meio que Edson Lodi encontrou para tratar de assuntos tão difíceis quanto perigosos, como os que envolvem práticas religiosas. É que o caminho encontrado por Lodi foi o da arte, tão pouco lembrada quanto se fala de manifestações religiosas da Ayahuasca.
Ou seja, este livro desfia sua história através da vida e da atividade do fotógrafo oficial dos primeiros tempos da União do Vegetal e das musicas que foram utilizadas por Mestre Gabriel e seus seguidores em suas praticas espirituais. Um repertório musical constituído pelos estilos e canções mais populares e tradicionais de nosso vasto sertão interior. Um Brasil de trabalhadores e homens simples tão pouco conhecido, e menos ainda reconhecido, repleto de arte e de fé. E por isso, improváveis leitores desta coluna, importante saber que este é um grande livro, daqueles que precisam ser lidos.
Sueño de La Razón
Mais recentemente fui convidado a participar do Festival Internacional de Fotografia de Porto Alegre (FESTFOTOPOA), onde as mesas redondas discutiram temas como preservação de acervos fotográficos, implantação de Pontos de Memória Fotográfica a partir da experiência dos Pontos de Cultura efetivada pelo MinC e os desafios contemporâneos da fotografia digital e sua profusão de imagens que parecem impossíveis de serem armazenadas na mesma velocidade com que são produzidas.
Mas o que mais me falou ao coração durante este festival - coordenado pelo grande parceiro do Acre, com vasta produção junto aos seringueiros daqui, Carlos Carvalho, a quem devo agradecer o convite e os meios necessários à minha participação - foi mesmo o lançamento da revista “Sueño de La Razón”. Produto de um coletivo de fotógrafos que atuam em nove países da América Latina e que se reúnem, mesmo sem nenhuma remuneração, em Santa Cruz de La Sierra para produzir esta linda revista, que destemidamente revela, não só a excepcional qualidade da fotografia que se pratica por aqui, como as entranhas dessa estranha América despedaçada que somos nós. Sobre, por exemplo a América do povo Mapuche que ainda luta no Chile, como faz já há quinhentos anos, por seu território original. Metáfora de um continente invadido, expropriado e ainda hoje dividido entre povos que não se conhecem e nem se respeitam.
O coletivo que produz essa revista está disponibilizando suas edições em PDF pra quem quiser conhecê-la (já disponível em www.olhave.com.br). Os números 0 e 1 já estão circulando e o financiamento que conseguiram garante apenas a publicação dos dez primeiros números. Torço muito pra que essa iniciativa possa durar muito mais porque nos serve de referência para o que deveríamos estar fazendo desde sempre: olhar atentamente pro interior dessa surpreendente e assustadora América, ainda que por mais nada, só pra nos inundar de sua beleza e força.
O Povo Manchineri e os Sítios Arqueológicos do Acre
Como já me estendi demasiadamente, vou ter que ser muito breve ao me referir a palestra da Pirjo Kristiina Virtanen. Tenho que reconhecer aqui que foi um grande prazer assistir a essa doce Finlandesa, que transita entre nós já há alguns anos, trazer de volta o resultado de seus trabalhos sobre temas tão variados como: jovens indígenas acreanos, mitos e história Manchineri e relações entre povos indígenas e os sítios arqueológicos geométricos (os ainda sensacionalistas geoglífos).
É raro ver pesquisadores comprometidos com as comunidades e sociedade com as quais se envolve durante sua pesquisa. A grande maioria dos mestres e doutores que escolhem coisas e gentes do Acre como tema, vem pra cá durante a pesquisa, ocupa a mídia, faz sua autopromoção travestida de genuíno interesse e colaboração com a sociedade regional e nunca mais aparece pra contar o que fez com tudo o que aprendeu por aqui.
Pois a Pirjo é uma exceção (daquelas que confirma a regra). Se envolveu com as pessoas daqui, foi sincera em suas intenções e praticas, produziu o que prometeu, e o que é ainda mais raro, reconheceu o que já estava sendo feito por aqui e voltou pra devolver seus resultados.
Com isso a Pirjo reflete a mesma conduta correta que seu mestre, o Prof. Martti Pârssinen, vem demonstrando em seus trabalhos, nos quais sempre cita corretamente as pesquisas, as datações, as hipóteses e conclusões que Ondemar Dias Jr, Célia Souza (que já acumula dez anos de saudades) e eu produzimos acerca dos sítios arqueológicos acreanos, nos últimos 30 anos. Quanta diferença em relação aos doutos senhores que, em sua extrema arrogância, acham que descobriram tudo e tomam descaradamente as conclusões alheias como se deles fossem, distorcendo as informações científicas de acordo com seus interesses pessoais inconfessados.
Assim a palestra da Pirjo foi mais uma comprovação cabal de que nada é superior à ética, quando lidamos com coisas tão sensíveis quanto o imaginário e a constituição cultural dos povos da floresta. Como vem demonstrando tão bem diversos pesquisadores que atuam no Acre.
Esta atuação eticamente irrepreensível pode ser facilmente encontrada, por exemplo, nos excepcionais trabalhos que vem sendo desenvolvidos por Manuela Carneiro e Mauro Almeida, cuja citação aqui não é gratuita, mas está relacionada à ultima publicação que ainda queria mencionar neste artigo.
Amazônia Antiga
É que esta semana recebi um presente muito precioso do grande amigo Marcelo Piedrafita. Trata-se do estraordinário livro “Tastevin, Parrisier: Fontes sobre Índios e Seringueiros do Alto Juruá” com transcrições de textos destes dois missionários franceses que percorreram o Juruá acreano ainda no final do século XIX e início do século XX. Uma leitura indispensável para a escrita da milenar história indígena acreana (assunto ao qual terei que voltar no futuro). O que me tem forçado, prazerosamente, é bom que se diga, há algum tempo na rede da varanda, sempre que o trabalho e os meninos deixam, enquanto desfolho esse verdadeiro tesouro em forma de livro.
Tenho mesmo que admitir, ler livros como esses aqui relacionados - que descrevem com maestria diferentes aspectos de nosso interior latino americano, amazônico, espiritual - é quase tão bom quanto sexo.
Relicário
Logo no reinício desta coluna prometi tratar mais detalhadamente do excepcional livro de Edson Lodi, um dos principais dirigentes da União do Vegetal, chamado “Relicário – Imagens do Sertão”. Um verdadeiro primor, a começar pela edição do livro, realizada com material de primeira qualidade e uma programação visual agradável, limpa e, o mais importante, que valoriza ainda mais o extraordinário conteúdo deste enorme trabalho de pesquisa.
Em “Relicário”, Edson Lodi descreve boa parte da trajetória desse importante personagem da história da Amazônia Ocidental e do Brasil: a vida e a obra do Mestre José Gabriel da Costa, criador da mais recente das três doutrinas que fundaram uma nova religiosidade, originada da floresta e dos povos que nela vivem, em nosso planeta já tão sofrido de tantas guerras e sofrimentos.
Mas, como já falei no lançamento acreano (realizado como parte da programação do Seminário das Culturas Ayahuasqueiras – que pra mim foi um dos mais importantes eventos ocorridos no Acre nos últimos tempos – mas que, por isso mesmo, merece um artigo específico) deste livro tão belo quanto importante, seu maior mérito talvez nem esteja em sua primorosa e bem cuidada edição, e nem mesmo em seu tema tão relevante. Talvez, sua mais importante contribuição esteja no original meio que Edson Lodi encontrou para tratar de assuntos tão difíceis quanto perigosos, como os que envolvem práticas religiosas. É que o caminho encontrado por Lodi foi o da arte, tão pouco lembrada quanto se fala de manifestações religiosas da Ayahuasca.
Ou seja, este livro desfia sua história através da vida e da atividade do fotógrafo oficial dos primeiros tempos da União do Vegetal e das musicas que foram utilizadas por Mestre Gabriel e seus seguidores em suas praticas espirituais. Um repertório musical constituído pelos estilos e canções mais populares e tradicionais de nosso vasto sertão interior. Um Brasil de trabalhadores e homens simples tão pouco conhecido, e menos ainda reconhecido, repleto de arte e de fé. E por isso, improváveis leitores desta coluna, importante saber que este é um grande livro, daqueles que precisam ser lidos.
Sueño de La Razón
Mais recentemente fui convidado a participar do Festival Internacional de Fotografia de Porto Alegre (FESTFOTOPOA), onde as mesas redondas discutiram temas como preservação de acervos fotográficos, implantação de Pontos de Memória Fotográfica a partir da experiência dos Pontos de Cultura efetivada pelo MinC e os desafios contemporâneos da fotografia digital e sua profusão de imagens que parecem impossíveis de serem armazenadas na mesma velocidade com que são produzidas.
Mas o que mais me falou ao coração durante este festival - coordenado pelo grande parceiro do Acre, com vasta produção junto aos seringueiros daqui, Carlos Carvalho, a quem devo agradecer o convite e os meios necessários à minha participação - foi mesmo o lançamento da revista “Sueño de La Razón”. Produto de um coletivo de fotógrafos que atuam em nove países da América Latina e que se reúnem, mesmo sem nenhuma remuneração, em Santa Cruz de La Sierra para produzir esta linda revista, que destemidamente revela, não só a excepcional qualidade da fotografia que se pratica por aqui, como as entranhas dessa estranha América despedaçada que somos nós. Sobre, por exemplo a América do povo Mapuche que ainda luta no Chile, como faz já há quinhentos anos, por seu território original. Metáfora de um continente invadido, expropriado e ainda hoje dividido entre povos que não se conhecem e nem se respeitam.
O coletivo que produz essa revista está disponibilizando suas edições em PDF pra quem quiser conhecê-la (já disponível em www.olhave.com.br). Os números 0 e 1 já estão circulando e o financiamento que conseguiram garante apenas a publicação dos dez primeiros números. Torço muito pra que essa iniciativa possa durar muito mais porque nos serve de referência para o que deveríamos estar fazendo desde sempre: olhar atentamente pro interior dessa surpreendente e assustadora América, ainda que por mais nada, só pra nos inundar de sua beleza e força.
O Povo Manchineri e os Sítios Arqueológicos do Acre
Como já me estendi demasiadamente, vou ter que ser muito breve ao me referir a palestra da Pirjo Kristiina Virtanen. Tenho que reconhecer aqui que foi um grande prazer assistir a essa doce Finlandesa, que transita entre nós já há alguns anos, trazer de volta o resultado de seus trabalhos sobre temas tão variados como: jovens indígenas acreanos, mitos e história Manchineri e relações entre povos indígenas e os sítios arqueológicos geométricos (os ainda sensacionalistas geoglífos).
É raro ver pesquisadores comprometidos com as comunidades e sociedade com as quais se envolve durante sua pesquisa. A grande maioria dos mestres e doutores que escolhem coisas e gentes do Acre como tema, vem pra cá durante a pesquisa, ocupa a mídia, faz sua autopromoção travestida de genuíno interesse e colaboração com a sociedade regional e nunca mais aparece pra contar o que fez com tudo o que aprendeu por aqui.
Pois a Pirjo é uma exceção (daquelas que confirma a regra). Se envolveu com as pessoas daqui, foi sincera em suas intenções e praticas, produziu o que prometeu, e o que é ainda mais raro, reconheceu o que já estava sendo feito por aqui e voltou pra devolver seus resultados.
Com isso a Pirjo reflete a mesma conduta correta que seu mestre, o Prof. Martti Pârssinen, vem demonstrando em seus trabalhos, nos quais sempre cita corretamente as pesquisas, as datações, as hipóteses e conclusões que Ondemar Dias Jr, Célia Souza (que já acumula dez anos de saudades) e eu produzimos acerca dos sítios arqueológicos acreanos, nos últimos 30 anos. Quanta diferença em relação aos doutos senhores que, em sua extrema arrogância, acham que descobriram tudo e tomam descaradamente as conclusões alheias como se deles fossem, distorcendo as informações científicas de acordo com seus interesses pessoais inconfessados.
Assim a palestra da Pirjo foi mais uma comprovação cabal de que nada é superior à ética, quando lidamos com coisas tão sensíveis quanto o imaginário e a constituição cultural dos povos da floresta. Como vem demonstrando tão bem diversos pesquisadores que atuam no Acre.
Esta atuação eticamente irrepreensível pode ser facilmente encontrada, por exemplo, nos excepcionais trabalhos que vem sendo desenvolvidos por Manuela Carneiro e Mauro Almeida, cuja citação aqui não é gratuita, mas está relacionada à ultima publicação que ainda queria mencionar neste artigo.
Amazônia Antiga
É que esta semana recebi um presente muito precioso do grande amigo Marcelo Piedrafita. Trata-se do estraordinário livro “Tastevin, Parrisier: Fontes sobre Índios e Seringueiros do Alto Juruá” com transcrições de textos destes dois missionários franceses que percorreram o Juruá acreano ainda no final do século XIX e início do século XX. Uma leitura indispensável para a escrita da milenar história indígena acreana (assunto ao qual terei que voltar no futuro). O que me tem forçado, prazerosamente, é bom que se diga, há algum tempo na rede da varanda, sempre que o trabalho e os meninos deixam, enquanto desfolho esse verdadeiro tesouro em forma de livro.
Tenho mesmo que admitir, ler livros como esses aqui relacionados - que descrevem com maestria diferentes aspectos de nosso interior latino americano, amazônico, espiritual - é quase tão bom quanto sexo.
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