Diário de campanha do cabo boliviano Hernan Lopez
25 de outubro de 1899
Estamos
começando hoje uma grande aventura. Minha alma de soldado está feliz porque
finalmente terei oportunidade para provar meu valor. Não existe nenhuma
felicidade maior do que a guerra para um homem que se quer guerreiro.
Esse
é o sentimento que toma conta de toda a tropa quando saímos de La Paz para cumprir importante
missão na selva. É verdade que sabemos muito pouco acerca do que nos espera. Só
sei que na região do rio Acre, alguns brasileiros insistem em não reconhecer
nossa soberania sobre aquelas terras. Portanto somos portadores da grave missão
de impor a lei e a ordem sobre aquela sociedade degenerada.
Nunca
mais poderei esquecer essa manhã de um sol radiante que ilumina o nosso
caminho, como que nos desejando boa sorte e sucesso.
31 de outubro
Nosso
comandante, Dom André Muñoz, novo Delegado Nacional da Republica, conduz os
soldados com altivez pelo altiplano andino. Porém os 3.000 metros de
altitude das montanhas, a aridez das estepes e o peso do equipamento militar
torna a caminhada bastante cansativa.
25 de novembro
Completamos
um mês de jornada e só agora alcançamos a região de neve eterna. Agora temos
que atravessar os afiados cumes da Cordilheira Real dos Andes, cujos picos
brancos eternamente nevados rasgam o céu. O ar muito fino parece não ser
suficiente para encher os pulmões ansiosos por oxigênio. Por todos os lados os
soldados, e mesmo os oficiais que viajam menos carregados, dão mostras de
cansaço. Mas nosso comandante não nos deixa esmorecer lembrando-nos da
importância de nossa missão.
9 de dezembro
Depois de tantos dias de caminhada por entre os abismos e
penhascos da descida dos contrafortes do oriente alcançamos as ultimas encostas
andinas e pudemos ver, pela primeira vez, um espetáculo soberbo. A selva
imensamente verde preenchendo o horizonte com um mar de folhas até onde alcança
nosso olhar. Larga planura somente recortada pelas águas tranqüilas do rio
Beni.
14 de dezembro
Alcançamos
Riberalta, povoado à margem do rio Beni, onde Dom Muñoz estabeleceu nosso
acampamento base. Do rio Acre chegam
notícias alarmantes. Um espanhol chamado Galvez conflagrou todo o Acre
proclamando uma Republiqueta da borracha. Mas antes de marchar sobre o Acre
precisávamos repor nossas forças depois da extenuante caminhada. Pelo menos
ainda poderemos ter um natal tranqüilo esse ano.
02 de Março de 1900
O Major Tapias foi ao Acre e voltou com mais noticias
ruins. O governo de Souza Braga que tomou o lugar de Galvez é ainda mais duro
no que diz respeito a nós bolivianos. Por isso nosso comandante decretou estado
de sítio em todo o território do noroeste e começou a recrutar homens, víveres,
armas na vasta região do alto e baixo Beni, Vila Bela, Madre de Díos e
afluentes do Orton. Impressionante é perceber que nossa própria população não
nos dá apoio material ou moral. Parecem completamente indiferentes à sorte do
Acre.
01 de maio
Partimos
de Riberalta em direção a Mercedes, barracão no rio Órton, que tornou-se nossa
nova base de operações. Começamos imediatamente a abrir um varadouro em direção
ao rio Acre que permitisse o deslocamento dos 400 homens que agora integram
nossa tropa.
30 de junho
Noticias
mais tranqüilizadoras nos chegam do Acre e motivam o animo da tropa. A flotilha
federal afastou Galvez e parece haver mais receptividade a um governo
boliviano. Dom Muñoz nos dá ordem para preparar a partida rumo ao Acre.
Finalmente chegaremos ao teatro das operações e poderei provar meu valor em
combate.
22 de agosto - Chegamos ao seringal
Capatará com D. Muñoz e mais 200 homens.
*
Frase do General Baldivieso descrevendo anos depois os acontecimentos (in
Tocantins, 1979, pag.417)
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