segunda-feira, 17 de setembro de 2012

“Cuando los hombres lloran, por algo lloran”* (I)


Diário de campanha do cabo boliviano Hernan Lopez


25 de outubro de 1899
Estamos começando hoje uma grande aventura. Minha alma de soldado está feliz porque finalmente terei oportunidade para provar meu valor. Não existe nenhuma felicidade maior do que a guerra para um homem que se quer guerreiro.
Esse é o sentimento que toma conta de toda a tropa quando saímos de La Paz para cumprir importante missão na selva. É verdade que sabemos muito pouco acerca do que nos espera. Só sei que na região do rio Acre, alguns brasileiros insistem em não reconhecer nossa soberania sobre aquelas terras. Portanto somos portadores da grave missão de impor a lei e a ordem sobre aquela sociedade degenerada.
Nunca mais poderei esquecer essa manhã de um sol radiante que ilumina o nosso caminho, como que nos desejando boa sorte e sucesso. 

31 de outubro
Nosso comandante, Dom André Muñoz, novo Delegado Nacional da Republica, conduz os soldados com altivez pelo altiplano andino. Porém os 3.000 metros de altitude das montanhas, a aridez das estepes e o peso do equipamento militar torna a caminhada bastante cansativa.


25 de novembro
Completamos um mês de jornada e só agora alcançamos a região de neve eterna. Agora temos que atravessar os afiados cumes da Cordilheira Real dos Andes, cujos picos brancos eternamente nevados rasgam o céu. O ar muito fino parece não ser suficiente para encher os pulmões ansiosos por oxigênio. Por todos os lados os soldados, e mesmo os oficiais que viajam menos carregados, dão mostras de cansaço. Mas nosso comandante não nos deixa esmorecer lembrando-nos da importância de nossa missão.

9 de dezembro
Depois de tantos dias de caminhada por entre os abismos e penhascos da descida dos contrafortes do oriente alcançamos as ultimas encostas andinas e pudemos ver, pela primeira vez, um espetáculo soberbo. A selva imensamente verde preenchendo o horizonte com um mar de folhas até onde alcança nosso olhar. Larga planura somente recortada pelas águas tranqüilas do rio Beni.

14 de dezembro
Alcançamos Riberalta, povoado à margem do rio Beni, onde Dom Muñoz estabeleceu nosso acampamento base.  Do rio Acre chegam notícias alarmantes. Um espanhol chamado Galvez conflagrou todo o Acre proclamando uma Republiqueta da borracha. Mas antes de marchar sobre o Acre precisávamos repor nossas forças depois da extenuante caminhada. Pelo menos ainda poderemos ter um natal tranqüilo esse ano.


02 de Março de 1900
O Major Tapias foi ao Acre e voltou com mais noticias ruins. O governo de Souza Braga que tomou o lugar de Galvez é ainda mais duro no que diz respeito a nós bolivianos. Por isso nosso comandante decretou estado de sítio em todo o território do noroeste e começou a recrutar homens, víveres, armas na vasta região do alto e baixo Beni, Vila Bela, Madre de Díos e afluentes do Orton. Impressionante é perceber que nossa própria população não nos dá apoio material ou moral. Parecem completamente indiferentes à sorte do Acre.

01 de maio
Partimos de Riberalta em direção a Mercedes, barracão no rio Órton, que tornou-se nossa nova base de operações. Começamos imediatamente a abrir um varadouro em direção ao rio Acre que permitisse o deslocamento dos 400 homens que agora integram nossa tropa.

30 de junho
Noticias mais tranqüilizadoras nos chegam do Acre e motivam o animo da tropa. A flotilha federal afastou Galvez e parece haver mais receptividade a um governo boliviano. Dom Muñoz nos dá ordem para preparar a partida rumo ao Acre. Finalmente chegaremos ao teatro das operações e poderei provar meu valor em combate.

22 de agosto - Chegamos ao seringal Capatará com D. Muñoz e mais 200 homens.

* Frase do General Baldivieso descrevendo anos depois os acontecimentos (in Tocantins, 1979, pag.417)

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