sábado, 11 de setembro de 2010

Antigas novidades da política acreana

(Mutações V)

Esta talvez seja uma das campanhas políticas mais chatas que eu já vivi. Não tem comício, nem showmício. Não tem os tradicionais bêbados no pé do palanque, nem camisa e nem boné com que carregar as cores de nossos candidatos. Mas, como as coisas não podem mesmo mudar tão rápido, ainda podemos assistir tragicômicos episódios em forma de socos e pontapés na tv, montes de dinheiro na caixa de papelão e tradicionais rivalidades sem as quais a política não teria a menor graça.



Estava eu entretido com as obrigações de todo dia no velho seringal urbano em que trabalhamos nós da cultura de Rio Branco, quando me chega de visita um dos antigos senhores acreanos que de quando em vez aparecem pra trocar uma prosa. Afinal, nada mais característico da cultura acreana do que praticar a boa e tradicional arte de lembrar e contar o lembrado.
Pois me disse ele que esta semana esteve num badalado evento social que reuniu a fina flor da rapiocagem local, como diria outro amigo acreano também antigo, e o que viu por lá o fez lembrar de um causo que lhe foi contado faz muito, muito, muito tempo...
É que, como todo mundo sabe, na época do Acre Território, lá pelos idos dos cinqüenta, a política acreana era dominada por Guiomard Santos e Oscar Passos. E os dois generais/caciques políticos, donos do PSD e PTB respectivamente, infalivelmente acabavam também sendo os donos absolutos das duas únicas vagas de deputado federal que o Acre tinha no Congresso Nacional.
Assim, neste tempo, o Acre todo se dividia entre Pessedistas e Petebistas, como antes já haviam se dividido entre os legionários e os construtores (também conhecidos como corocas e urucubacas). E a disputa era por demais acirrada, muitas vezes chegando às raias da insensatez. Aliás, bastante diferente do que podemos observar na atual política acreana???!!!
Ocorreu então que, no meio de uma dessas acirradas campanhas, Oscar Passos decidiu minar as forças de Guiomard em seu próprio reduto eleitoral. E a bordo de seu indefectível jipe o petebista veio até a longínqua colônia do São Francisco. Naquela época, uma verdadeira aventura já que o caminho de terra não facilitava a vida de ninguém. Pense na ladeira do São Francisco, agora pense numa dificuldade monstra.
E em pleno reduto guiomarista, que era a “colonha” São Francisco, Oscar Passos desandou a destratar seu adversário político: “Porque o Guiomard está louco. Onde já se viu querer transformar o Território Federal em Estado. Será que ele não sabe que sem o dinheiro do governo federal o Acre tá lascado? Isso é uma verdadeira doidice...”
E tantas Oscar Passos disse e redisse que um dos moradores da Colonha ficou verdadeiramente indignado e logo decidiu: “Não. Isso não pode ficar assim. Meu cumpadre Guiomard precisa saber disso. Vou lá na cidade falar com ele... Ele precisa saber o que essa féla da mãe anda falando dele...” E lá se veio o pobre homem, patinando no barro, horas a fio, já que, diferente do General Oscar Passos, jipe ele não tinha. Mas mesmo diante de tantas dificuldades, vinha munido de tamanha indignação que não se permitia esmorecer.


Mal chegado no centro da cidade o homem rumou direto pro Hotel Chuí, que então era a casa de todos eles quando estavam no Acre, Guiomard, Oscar e tantos quantos faziam da política no distante Acre seu modo de vida. Logo foi informado que Guiomard se encontrava salão do Hotel.
Qual não foi a surpresa do homem ao se deparar com Guiomard sentado à mesa, num conversê danado, com o Oscar Passos. O pobre homem não podia acreditar no que seus olhos viam, tanta era a risadagem dos dois generais/caciques. E mais abismado ainda ficou ao pescar um trecho da conversa dos dois, justo na hora em que Oscar dizia ao seu arquiinimigo:
- Pois é tive lá no seu reduto, no São Francisco, disse poucas e boas do teu projeto e descasquei pra cima de ti... Há, Há, Há!!!
Ao que de bate pronto respondeu Guiomard Santos, em meio à outra grande risada:
- Tem problema não. Saiba que ainda ontem eu estive lá no Quinze (reduto forte de Oscar Passos) e falei muito pior de ti...
E logo estavam os dois se rindo juntos... diante do atônito homem exausto pela difícil caminhada até ali e, pior, enfurecido pela cena que estava presenciando. Não lhe restou outra alternativa, então, senão se aproximar da mesa dos poderosos generais e descascar pra cima de ambos, que era a única forma de não perder de todo a viagem...
Pois bom (como diria Seu Agnaldo Moreno, outro ferrenho pessedista)! Esta semana, ao chegar ao lançamento do novo livro de um dos principais jornalistas do Acre atual, nosso antigo amigo logo se lembrou da história brevemente contada acima, ao perceber tradicionais adversários políticos acreanos ali reunidos em animadas rodas de conversa. Quem quer que os vissem assim, inadvertidamente, em meio a tanto conversê e risadagem, não poderia imaginar que esses mesmos políticos protagonizam tantas e tão profundas brigas diárias na atual disputa eleitoral.
Eu, de minha parte, fiquei embatucado e me perguntando: Será isso bom ou ruim???? Confesso que não sei responder... Só sei que a cultura política acreana sempre foi e ainda é assim...

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