sábado, 4 de fevereiro de 2012

Da descoberta do amor

Aproveitando que dois de fevereiro foi dia de homenagearmos Iemanjá e que acabei de voltar da beira mar...

Lembro-me bem, apesar de já estar chegando aos cinquenta, dos primeiros amores de minha vida. Afinal, amor de menino é assim: puro, inocente, ingênuo, mas intenso e definitivo. E, o melhor, agora eu sei, provoca na gente um tipo de lembrança que faz juz ao sentido do termo “recordar”: do latim re cordis, voltar ao coração. Memórias tão profundas e entranhadas em mim que ao sair de algum canto recôndito de meu ser e voltar ao coração fazem a respiração falhar, o corpo estremecer e a mente sorrir. Como é bom ser menino e crescer com coisas boas pra lembrar.
Pois bem, toda essa onda de explicita nostalgia foi só pra introduzir o assunto do artigo de hoje. É que, neste inicio de ano, finalmente, levei meus pequenos pra conhecer o mar... E tenho que confessar que a simples expectativa de fazer isso me encheu de lembranças. Porque, como nasci em Copacabana e cresci no Flamengo, ambos bairros com praias, vivi muitas histórias boas ou terríveis no mar.




Assim, como numa preparação ao que iria acontecer me pus a lembrar de como era bom passar o dia inteiro na praia numa época em que sequer existia essa coisa de filtro solar e as meninas cultivavam a lenda de que passar coca-cola melhorava o bronzeado. Lembrei de quantos castelos de areia construí e de como catava os “Tatuís” enterrados para povoar meus magníficos castelos destinados a desaparecer na primeira onda mais forte que viesse lamber as areias onde eu brincava. E de como era bom ter o corpo inteiro coberto pela areia quentinha de sol e depois sair rolando todo “enfarofado” até alcançar a água. É que, em nossa inocência, não sabíamos ainda das famigeradas micoses que certamente estariam escondidas naquela areia aparentemente tão branquinha e limpinha. Assim como podíamos realizar intermináveis guerras de nossas temíveis “bombas de areia”, feitas com areia molhada recoberta por areia seca e que tornávamos bolas perfeitamente esféricas graças à sutil arte de menino, sem que nenhum adulto brigasse com a gente já que no fim da tarde a praia ficava vazia e era toda nossa.


Mas, nenhuma outra lembrança voltou com tanta força, nestes dias pré-viagem, que a sensação, impregnada de absoluta certeza, de que era o mar que gostava de mim e brincava comigo mandando pequenas ondas nas quais me jogava pra que elas me levassem até a areia, só pra voltar pulando, correndo e rindo pra mergulhar de novo “furando” a próxima onda. Rapaz!!! Olhando hoje pra essas imagens, que vejo quando fecho os olhos, tenho novamente a sensação, impregnada de absoluta certeza, de que o mar foi meu primeiro grande amor de menino. Afinal, naquela época eu não me interessava ainda por meninas, a não ser como companheiras ou rivais de brincadeiras. Além do que é óbvio que não to contando com o amor de/pela mãe, porque esse não está fora, já nasce com a gente, existe desde sempre, ou se preferir, desde o ventre.
Por isso, não é difícil imaginar como eu estava ansioso por ver meus meninos na praia. Como reagiriam? Conseguiriam superar o medo natural dessa entidade tão grande e poderosa que é o mar? Saberia eu conduzir seus primeiros passos mar adentro como meu próprio pai havia feito comigo?
Mas minhas preocupações logo se revelaram uma grande besteira. Foi lindo ver a surpresa nos olhos deles já ao pisar na areia quente. Então é assim que é a praia pai? Começa com essa longa travessia, driblando gente, quarda-sóis, barcos de pesca e vendedores ambulantes? E o que dizer da água gelada, então? Pai!!! A água é salgada, olha só! Diziam os dois quase ao mesmo tempo enquanto passavam a língua pelos lábios e descobriam por eles mesmos aquelas coisas que não pode ser explicadas ou contadas, devem ser vividas pra se tornarem verdadeiras. Menino! Não faz isso que essa água é suja!!!


Não demorou muito pra que o Yago, do alto de seus sete anos, se jogasse na primeira ondinha que ousou desafiá-lo. Enquanto Vinicius, com toda a “cautela” que Deus houve por bem lhe dar, graças a Deus, experimentava entrar só até a canela pra então voltar pra areia. E, desconfiadamente, bem de acordo com seus cinco anos de forte personalidade, entrar de novo na água pra ir até o joelho e voltar pra areia. E repetir o mesmo processo até que a água chegasse à sua cintura, sua barriga, seu peito, onde decidiu: aqui já tá bom. Chega!


Daí pra frente foi presenciar, satisfeito, as mesmas cenas que meu coração de menino guardava já faz tanto tempo. Os meninos bolando na areia, o prazer das ondas que vem e vão jogando a gente pro raso e pro fundo numa interminável brincadeira, a construção de novos e efêmeros castelos de areia, os barcos chegando repletos de peixes de cores e formatos ao mesmo tempo atraentes e estranhos. Até que o por do sol, pr’além do fim do mar, definisse chegada a hora de ir pra casa, em meio a infinitos e invencíveis protestos de meus meninos felizes.



Pois foi assim que foi. E isso tudo não passaria de pequenas lembranças de férias, não tivesse o Yago, nesta semana, me perguntado: Pai a gente pode ir pra praia de novo no mês que vem? Foi quando não pude deixar de sorrir de sua inocência e ficar feliz por perceber que meu menino havia encontrado um dos primeiros amores de sua vida.

Um comentário:

  1. Você não narrou com riqueza de detalhes somente um dos primeiros amores da vida do Yago. Esse teu texto descreveu o primeiro encontro com o mar de cada um que já viveu isso. Phoda!

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