segunda-feira, 16 de maio de 2011

Negra Amazônia

Quando eu era menino o dia 13 de maio era dia de festa em todos os terreiros de Umbanda e Candomblé. Mais recentemente o movimento negro brasileiro trocou o dia da abolição da escravidão pelo dia 20 de novembro, que passou a ser chamado de Dia da Consciência negra. Ainda assim, quero aproveitar a passagem desta data, na última sexta-feira, para lembrar a participação africana na formação amazônica e na Cabanagem, um dos maiores movimentos políticos e sociais já ocorridos na história do Brasil.



Os africanos
Pela dificuldade de aprisionamento e pela vulnerabilidade às doenças, os índios amazônicos (também chamados de negros da terra) não se adaptavam a muitas atividades econômicas necessárias ao colonialismo. A partir da segunda metade do século XVIII, assim como em outras regiões da colônia, a carência da mão-de-obra foi suprida, ou pelo menos amenizada, com a chegada dos negros trazidos da África na condição de escravos. No Baixo Amazonas, os negros foram empregados nas construções, cada vez mais numerosas, nas plantações de cacau, na agricultura de subsistência e na pecuária. Mas também, como no Nordeste, o negro incorporou-se ao ambiente das casas senhoriais e nas atividades domésticas. Poucos subiam o Amazonas. A colonização portuguesa que os transportava ainda se concentrava nas proximidades da foz do rio. Assim, a presença dos negros na população amazônica ficou concentrada no Pará e no Amapá. Os escravos negros que conseguiam fugir se embrenhavam pela floresta e criavam pequenas comunidades conhecidas como quilombos.


Amazônia Portuguesa
O estabelecimento do Tratado de Madri e o início da administração de Marquês de Pombal em Portugal, ambos ocorridos em 1750, marcaram uma nova fase na qual a Amazônia brasileira foi, em linhas gerais, definida.
Vale lembrar que, nessa época, o conhecimento que se possuía do interior do continente americano ainda era muito impreciso. O Mapa das Cortes, elaborado a pedido do rei de Portugal, serviu de base para as negociações do Tratado de Madri e possuía forte distorção do curso dos rios que cortam as terras a oeste do Brasil. Essas distorções eram propositais, puxando o traçado dos rios para leste, diminuindo artificialmente a área pretendida pelos portugueses – e cumpriram perfeitamente o objetivo de desorientar os negociadores espanhóis.
Não menos importante do que o Tratado de Madri para a inauguração de uma nova fase da história amazônica foi a administração empreendida pelo Marquês de Pombal. Tão logo subiu ao poder, ainda em 1750, Pombal pretendia tirar Portugal da situação de atraso que experimentava frente às demais potências européias e da dependência da Inglaterra, país do qual recebia proteção contra a França e a Espanha.
Pombal criou a Companhia Geral do Comércio do Grão-Pará e Maranhão que deveria oferecer preços atraentes para as mercadorias ali produzidas a serem consumidas na Europa, tais como cacau, canela, cravo, algodão e arroz. Começou também a introduzir na Amazônia a mão-de-obra escrava de origem africana.
Em 1759, Pombal determinou a expulsão dos jesuítas de Portugal e seus domínios, com o confisco de todos os seus bens. Os missionários, e em especial a Companhia de Jesus, eram acusados de tentar criar um estado próprio dentro do reino português.
Pombal pretendia também consolidar o domínio português nas fronteiras do Norte e do Sul do Brasil através da integração dos índios à civilização portuguesa. Essa jogada política garantiria o aumento das terras portuguesas de acordo com o Tratado de Madri. Por isso, proibiu a escravidão indígena, transformou aldeias amazônicas em vilas sob administração civil e implantou uma legislação que estimulava o casamento entre brancos e índios. Consolidava-se assim a presença portuguesa no imenso território que hoje constitui o Brasil.




Amazônia brasileira
Na metade do século XIX, findo o período das “drogas do sertão” e iniciada uma ocupação mais sistemática da Amazônia, temos uma nova base cultural estabelecida. A fronteira do território da Amazônia brasileira permaneceria móvel até o início do século XX, quando os contornos políticos do Brasil seriam definidos com a conquista dos territórios do Amapá e de Roraima, ao Norte, e do Acre, no extremo Oeste.
Estes extremos, especialmente as regiões dos altos rios, na parte mais ocidental da floresta, permaneciam como área de refúgio dos primeiros habitantes, os povos indígenas mais arredios que não foram incorporados aos empreendimentos colonialistas, nem de Portugal nem da Espanha. Esta Amazônia profunda retinha suas riquezas em segredo e realimentava o mito do “inferno verde”.



A Cabanagem e a crise da economia colonial
A adesão do Pará à independência do Brasil, em 1823, provocou forte frustração nacionalista da parte da elite amazônica, que se ressentia de ter sido afastada das decisões políticas e econômicas do país. O poder, no Império brasileiro, continuaria concentrado nas mãos dos conservadores que exploravam o Pará desde o tempo da colônia.
Em 1835, irrompia no Pará a Cabanagem, marcada por ataques e a tomada de Belém, onde foi proclamada a independência do Pará em relação ao Brasil. A Cabanagem não foi simplesmente uma revolta popular, era uma frente ampla que congregava burgueses nacionalistas insatisfeitos, militares que desejavam alcançar mais altos postos, políticos que queriam maior fatia de poder, escravos que ansiavam pela liberdade, índios e mestiços movidos por séculos de dominação e opressão portuguesa.
As lutas prosseguiram até 1840. No final, o saldo foi de 30 mil mortos entre rebeldes e legalistas. Belém foi quase totalmente destruída e sua economia devastada.
A Amazônia brasileira permaneceria ainda por muitos anos mergulhada em uma situação de grave decadência econômica e social. Somente com a criação da Província do Amazonas, em 1850, por desmembramento do Grão-Pará, e os primeiros movimentos de valorização da borracha extraída da seringueira, a região experimentaria um novo alento.


* Trecho de artigo que escrevi para o Projeto “Tom da Amazônia”, da Fundação Roberto Marinho e parceiros.

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