sábado, 16 de junho de 2012

As cinco décadas do Estado do Acre (III)

Na sexta-feira o Acre completou cinquenta anos desde que tornou Estado. Resultado de um longo processo histórico que teve muitos altos e baixos. No artigo de hoje, o que aconteceu com o movimento autonomista durante os duros anos da crise da borracha, quando tudo parecia perdido...


Com e sem borracha

Nas semanas anteriores vimos como e porque foi criado o Território Federal do Acre. E também que esse regime estranho e autoritário deu origem à uma intensa fase de revoltas e lutas armadas pela autonomia politica e desenvolvimento econômico do Acre. Afinal, como nos conta Craveiro Costa na "Conquista do Deserto Ocidental", só com os impostos federais sobre sua borracha, em cerca de cinco anos, o Acre já havia pago ao governo brasileiro todas as despezas decorrentes da anexação ao Brasil.

Assim, depois das intensas lutas autonomistas ocorridas entre 1904 e 1920, a grave crise da borracha, iniciada em 1913, quando, pela primeira vez, toda a produção de borracha amazônica foi superada pela borracha de cultivo do sudoeste asiático derrubando o preço desta matéria prima, começava a deixar muito poucos motivos para que o Acre continuasse reivindicando sua autonomia. Pensando bem, talvez fosse melhor mesmo ser Território Federal porque isso ao menos garantia que as despesas continuariam sendo pagas pela República.

Na verdade, nos anos 20 e 30 do século passado, com a crise da borracha o Acre havia se tornado aquilo que Océlio de Medeiros chamou, em seu livro "A Represa", de "Um igapó de almas, rios que perderam seus destinos para se tornar como que um pântano de águas putrefatas..." De fato, os seringais faliam um atrás do outro e se esvaziavam de trabalhadores que, sem a motivação do enriquecimento rapido proporcionado pelo corte da seringa iam embora aos milhares, invertendo o fluxo migratório que anos antes havia povoado essas florestas.

Ainda assim, em varias cidades acreanas, continuavam circulando jornais que mantinham vivas as ideias autonomistas, mesmo que sem grande ressonância numa sociedade combalida pela decadência econômica pronunciada.


Corocas e Urucubacas

A situação política só comecou a mudar mesmo com a Revolução de 30 que abalou as estruturas da República Velha. Até então a questão da autonomia do Território Federal do Acre só havia sido debatida no Congresso Nacional gracas à atuação de parlamentares de outros estados, notadamente Ceará e Rio Grande do Sul, já que o Acre não dispunha de representação no legislativo nacional.

Com a constituição de 1934, o Acre passou a ter direito de eleger dois deputados federais para defender seus interesses no Congresso. Mas, para tanto, seria necessário antes organizar partidos politicos já que com a falta de democracia no Território, só havia clubes e agremiações politicas sem caráter legal.

Assim, os diversos grupos autonomistas se agruparam em um partido chamado de Legião Autonomista e os segmentos contrários à transformação do Acre em Estado reuniram-se no Partido Construtor, pela idéia de que primeiro seria necessário construir o Acre para só depois torna-lo um Estado de fato e de direito. E foram esse dois partidos políticos que passaram a disputar eleições a cada quatro anos para eleger deputados federais.

Mas, como aqui no Acre, eleições, apesar de sempre muito aciradas, acabam invariavelmente desaguando em ironia e galhofa. Os integrantes dos dois partidos políticos acabavam denominando seus adversarios por jocosos apelidos. Uns eram os "Corocas" (os velhos de idéias caquéticas) e outros os "Urucubacas" (azarados pra quem nada dava certo). Ou seja, a partir de 1934 o movimento autonomista entrou numa nova fase. Um período de organização político-partidária que logo teria uma mudança de configuração.


Petebistas e Pessedistas

Esta situação permaneceu até 1945 quando o fim da Ditadura Vargas e da Segunda Guerra Mundial, que havia promovido no Acre a "Batalha da Borracha" e a recuperação da economia seringalista, deu lugar a uma nova constituição federal. E, por conta deste novo arranjo politico em que se estabeleceram partidos nacionais, no Acre a Legião Autonomista se tornou o PTB, e o Partido Construtor se transformou no PSD. Criaram-se também a UDN, o PCB, entre outros, mas estes nunca conseguiram adquirir grande expressão local.

A partir de 1946, portanto, a representação do movimento autonomista passou a ser abrigada no interior do PTB, pelo menos em tese, já que o carater nacional destes partidos parece ter diluido os ideiais autonomistas nesta fase da história acreana. Tanto assim que, em 1957, quem apresenta no Congresso Nacional um polêmico projeto de lei de transformação do Território em Estado foi o Deputado Federal Guiomard Santos, então lider do PSD acreano.

A julgar por sua origem historica, quem deveria ter apresentado esse projeto era o PTB. Mas, como Guiomard Santos e o PSD tomaram pra si essa bandeira, não restou outra alternativa aos petebistas liderados por Oscar Passos senão ficar contra o projeto do Acre Estado. Porque essa era a lógica política acreana então... se o PSD era a favor, o PTB tinha que ser contra, e vice versa, fosse qual fosse o tema em questão. Começava assim, sob o signo de uma inerente contradição histórica, a ultima fase do movimento autonomista acreano.

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